Resumen:
O Estado neoliberal e as políticas sociais:uma relação de conflitos O Estado: um conceito em disputa: Em “Ideologia alemã”, Marx e Engels (2001) refletem sobre a formação do Estado Moderno, alcançado pela burguesia que se constitui enquanto uma classe que precisava se organizar no plano nacional e dar uma forma universal aos seus interesses comuns, porém de forma ilusória, pois o Estado “está sempre vinculado à classe dominante e constituiu o seu órgão de dominação” (MARX; ENGELS, 2001, p. 31) para alcançar a citada hegemonia.Corroborando esse entendimento sobre o Estado, Osório (2014) reflete que o Estado capitalista expressa não somente uma correlação de forças na qual predominam os interesses das classes dominantes, antes disso, refere-se à: […] uma relação social que cria força e modifica essas correlações em favor dos que dominam. Supor que o Estado “reflete” a luta de classes implica concebê-la como uma entidade neutra, que revela o ponto em que se encontra a correlação de forças entre as classes, algo assim como um termômetro político. Mas, ao contrário, o Estado tem um papel ativo na luta de classes a favor da integração e da organização das classes dominantes e da dispersão e desarticulação das classes dominadas (OSÓRIO, 2014, p. 51). O autor supracitado afirma que a ideia de que o Estado burguês expressa “conquistas” dos dominados, como direito à greve, sindicalização, partidos populares, fórmulas democráticas de dominação, deve ser entendida dentro desses limites. “São conquistas, porém desvirtuadas e filtradas pela ação estatal” (OSÓRIO, 2014, p.51, grifos nossos).Para Pereira (2008), há desafios para a definição de Estado pois existem diferentes noções acerca desse instrumento e sua ideia é associada e confundida aos seus órgãos ou elementos constitutivos. Compreende-se que o Estado não é um fenômeno isolado, fechado ou circunscrito a si mesmo, pois ele está em constante relação com a sociedade. (PEREIRA, 2008). A concepção acima citada destaca a centralidade nas relações entre as classes sociais, constituindo uma dinâmica de disputa por projetos societários no interior e entre as classes que, ao longo da história, diversifica as estratégias de dominação do Estado burguês e sua interação com a sociedade. 2.1 Estado, Políticas sociais e Neoliberalismo A intervenção Estatal na sociedade contemporânea é marcada por amplos debates, sobretudo políticos e ideológicos, que colocam projetos societários em disputa. Nesse enredo, o liberalismo surge como uma proposta de Estado não intervencionista, com uma economia organizada estritamente pelo mercado. Contraditoriamente, o neoliberalismo foi constituído com “a ajuda das tarifas protetoras, de exportações subvencionadas e de subsídios indiretos dos salários” (CARCANHOLO; BARUCO, 2011, p. 12), ou seja, o dito mercado livre é sustentado pelo Estado em todo seu processo. Assim, verifica-se que o sistema de mercado necessitou do Estado para sua implementação e, uma vez constituído, dele carece para sua manutenção. “O liberalismo econômico pode, portanto, pedir que o estado use a força da lei; pode até mesmo apelar para as forças violentas da guerra civil a fim de organizar as precondições de um mercado autorregulável” (POLANYI, 2000, p. 152-153).Essa contradição da presença/ausência do Estado, aliada às crises produtivas do capitalismo, provoca outras propostas políticas e ideológicas que, mais uma vez, destacam o papel do Estado como, por exemplo, o Estado de Bem Estar Social (Welfare State), pautado por um Estado intervencionista através de políticas sociais na perspectiva de manter o consumo e pleno emprego para acompanhar a produção do sistema fordista que, na década de 1970, entra em crise (CARCANHOLO; BARUCO, 2011, p. 12).Assim, a problemática que se engendrou nos últimos anos não paira sobre a avaliação se o Estado foi menos ou mais interventor, pois ele sempre será interventivo, o que se questiona é o padrão dos gastos estatais, agora perceptivelmente em detrimento das políticas sociais de caráter universalizante. Trata-se, isto sim, de um Estado comprometido com a valorização capitalista financeiro-fictícia e, para que isso seja possível, a restauração do capital exigiu, […], um Estado “mini-max”, mínimo para o trabalho e máximo para o capital. Ao afirmar uma suposta necessidade de redução do tamanho do Estado, o ataque do grande capital se dirige, na verdade, contra as dimensões democráticas da intervenção do Estado na economia, fundamentalmente suas dimensões coesivas (CARCANHOLO; BARUCO, 2011, p. 12). É nesse cenário que a proposta neoliberalista se consolida em substituição ao keynesianismo do Welfare State. O comportamento econômico passou a determinar o comportamento dos seres humanos em sociedade, invertendo valores e visões sobre a realidade, incluindo sobre a desigualdade social. Do ponto de vista econômico, a desigualdade é vista nesse modelo como uma meta, pois é o que “[…] dá sentido à busca por produtividade e eficiência, enquanto que, do ponto de vista moral, o incentivo ao esforço pessoal só teria sentido com a desigualdade, ou melhor, a diferenciação social seria o prêmio por aquele primeiro” (CARCANHOLO; BARUCO, 2011, p. 12).Logo, as estratégias para o combate à desigualdade e para a ampliação da proteção social, como as políticas sociais, passam a ser vistas como empecilhos para uma ordem neoliberal. Assim, para a ampliação dessa proposta política-ideológica, o conceito das políticas sociais precisa ser substituído “pela fria constatação da inevitabilidade da pobreza e da miséria, levando a um caminho que nos obriga a tratar o fenômeno apenas em suas manifestações mais agudas, portanto, de forma localizada e fragmentada” (IASI, 2017, p. 221).Desta forma, o neoliberalismo passa a ditar de que forma o Estado intervém na desigualdade social e, nessa proposta política-ideológica, as políticas sociais não ocupam um lugar de centralidade, desresponsabilizando-se de sua oferta. Referências IASI, M. Política, Estado e ideologia na trama conjuntural. São Paulo: Instituto Caio Prado Junior, 2017. KARL, M.; ENGELS, F. Ideologia alemã. São Paulo: Martins Fontes, 2001. OSÓRIO, J. O Estado no centro da Mundialização: a sociedade civil e o tema do poder. São Paulo: Editora Outras expressões, 2014. PEREIRA, P. A. O. Política social: temas & questões. São Paulo: Cortez, 2008. POLANYI, K. A grande transformação: as origens de nossa época. Rio de Janeiro: Campus,2000.