Resumen:
Este trabalho objetiva apresentar, resumidamente, os resultados da pesquisa intitulada “Serviço Social, Classe, Gênero e Raça: tendências teórico-metodológicas e as possíveis contribuições da Teoria Unitária”
(OLIVEIRA, 2021) que analisou as tendências teórico-metodológicas utilizadas nas produções científicas do Serviço Social brasileiro sobre as relações sociais generificadas e racializadas da sociedade capitalista, a partir da ontologia marxista e da crítica da Teoria da Reprodução Social (TRS). O estudo foi construído metodologicamente por meio de uma pesquisa bibliográfica-exploratória de caráter quanti-qualitativo. Foram analisados vinte números da
Revista Temporalis, publicados entre os anos de 2010 e 2021, com 297 (duzentos e noventa e sete) trabalhos, dos quais cinquenta (50) dialogavam com o objeto da pesquisa. O Serviço Social brasileiro, reconhecido como área de conhecimento, após a sua maioridade intelectual visceralmente articulada ao adensamento marxista, na década de 1980, passou a desenvolver pesquisas sobre temáticas diversificadas relacionadas a complexidade da vida social sob a ordem do Capital, hoje sistematizadas pelos Grupos Temáticos de Pesquisas (GTPs) da Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social (ABEPSS). Como reflexo desse movimento, há o crescimento expressivo das tentativas dos e das profissionais em categorizar as relações sociais generificadas e racializadas do capitalismo. Através de amplo e diversificado arcabouço teórico-metodológico, essas análises se fundamentam em matrizes teóricas distintas. Tomamos como exemplos emblemáticos pesquisas que se baseiam no Feminismo Materialista Francófono e no Feminismo Interseccional, ao compreender que são correntes epistemológicas capazes de fornecer ferramentas heurísticas de apreensão da realidade das mulheres e das pessoas racializadas no capitalismo, assim como a adesão à pós-modernidade, que, de forma menos crítica, subsidia análises frequentemente fragmentadas da realidade social. Há um consenso na literatura de que o Serviço Social começou a mobilizar-se politicamente em torno das questões de gênero, sexualidade e de raça a partir da década de 1990 (TIBURTINO, 2015; SOUZA, 2014; INACIO, 2013; LISBOA; PINHEIRO, 2005; TEIXEIRA, 1998). Esse processo é indissociável da construção do Projeto Ético Político do Serviço Social (PEPSS), momento no qual a categoria profissional se posiciona publicamente na defesa da liberdade como valor ético central, na defesa intransigente dos direitos humanos e em respeito à diversidade humana. São princípios da luta pela universalização dos direitos e da justiça social, expressos desde o Código de Ética de 1993 e nas Diretrizes Curriculares para o Curso de Serviço Social, em 1996. Essa década é marcada, portanto, pelo posicionamento explícito da profissão no enfrentamento a todos os tipos de opressões, discriminações e preconceitos. Entretanto, a profissão passou décadas sem consolidar uma fundamentação teórica que possibilitasse uma melhor apreensão das relações sociais generificadas e racializadas do capitalismo, em diálogo mais contundente com o acúmulo teórico-metodológico desenvolvido pelos estudos feministas e raciais, associados à teoria marxista. Nesse sentido, desde a década de 1990, configura-se um esforço no Serviço Social de desenvolver de forma mais intensa as dimensões ético-política e técnico-operativa em torno dos debates raciais, de gênero e sexualidade – por meio das campanhas e resoluções lançadas historicamente no interior da profissão, associados, sobretudo, ao exercício profissional. Entretanto, há um menor desenvolvimento da dimensão teórico-metodológica, que ainda é percebida por nós como uma dimensão bastante marginal na formação profissional. Compreendemos as dimensões ético-política, técnico-operativa e teórico-metodológica de maneira indissociável. Afinal, na prática a teoria não é outra (SANTOS, 2013) e, por isso, no exercício profissional e na formação profissional há a indissociabilidade das dimensões supracitadas. Isso faz com que essa questão se torne ainda mais grave, pois a ausência de uma fundamentação teórica-metodológica que apreenda com coerência científica e metodológica os determinantes das relações sociais capitalistas generificadas e racializadas, pode impelir prejuízos na instrumentalidade do e da assistente social. A análise dos dados aponta que os artigos estão situados em três temáticas guarda-chuvas:
Mulheres, gênero e feminismos em 64% dos artigos;
Raça, etnia e luta antirracista em 22% e;
Sexualidade, diversidade sexual e luta LGBTQIA+ em 14%. Os artigos analisados estão classificados em quatro tendências: 1) crítica de cariz marxista; 2) formal-descritiva; 3) crítica-eclética-pós-moderna; e 4) indefinida. O estudo aponta que é notório o esforço epistemológico desempenhado pelo Serviço Social em adensar a análise sobre gênero, raça e classe, numa perspectiva crítica, por mais que o método materialista histórico-dialético ainda esteja em processo de amadurecimento no seio da profissão. Isso se tornou evidente ao verificar a utilização, recorrentemente de forma indiscriminada, de diferentes autores e autoras fundamentados em matrizes teóricas diversificadas. Na ausência de um rigor metodológico mais criterioso, muitas pesquisas reproduzem uma lógica eclética de produção de conhecimento. Na tentativa de avançar continuamente, esta pesquisa considera que a concepção da Teoria Unitária pode oferecer a materialização de uma sintonia mais profunda entre o marxismo e as práxis feminista e antirracista, na perspectiva ontológica de produção de conhecimento, alicerçada no materialismo histórico-dialético, e neste sentido contribuir para o desenvolvimento de um feminismo-marxista ou marxismo-feminista que tenha como primazia o estudo da totalidade social, no qual raça, etnia, gênero e sexualidade sejam compreendidos como totalidades parciais (complexos parciais) desta totalidade. A perspectiva unitária e sua proposta ontológica de produção de conhecimento possuem mais sincronia com a escolha teórica-política marxista do Serviço Social, que ao longo das últimas décadas se expressa por meio da construção do Projeto Ético-Político do Serviço Social.