Resumen:
O presente ensaio busca refletir o cenário da educação superior no contexto contemporâneo de crise do capital e a beligerância do neoliberalismo como forma de orientação, produção e reprodução da vida em sociedade. Reflete a reconfiguração da educação sob os marcos da reestruturação produtiva e como esse processo tem impactado o ensino superior, com destaque na formação em Serviço Social brasileira, sobretudo, nos marcos do contexto pandêmico da COVID-19, ao qual se aprofundam as medidas reorganizativas do capital, tendo como expressão o Ensino Remoto Emergencial (ERE), no caso brasileiro, autorizado pela Portaria 343/2020 do Ministério da Educação. Movimenta sua atenção as incidências deste processo na particularidade da formação no âmbito da Faculdade Paulista de Serviço Social de São Caetano do Sul, localizada no Estado de São Paulo, Brasil. Compreende que a crise estrutural do capital não é um processo desencadeado de modo imediato e correspondente ao contexto de pandemia ocasionado pelo surgimento do vírus SARS-COV2, mas uma expressão cíclica do modo de produção capitalista que tem incidência no contexto mundial desde a década de 1970 (ANTUNES, 2020), período em que o mundo da produção se reconfigura para atender as demandas do capital para atingir maior exploração e extração de mais-valia (MANDEL, 1978, BEHRING, 2009). É sob esse contexto que a educação superior vem sofrendo nas últimas décadas o impacto e a incorporação das orientações da reestruturação produtiva, orientando-a à uma perspectiva de mercado, que delibera pela sua privatização em escala sem precedentes, alterando sua concepção para um modelo de negócio, no qual o ensino aprendizagem torna-se pragmático, burocrático, sem tempo para a produção do conhecimento e reflexão crítica. Processo que se agrava e intensifica contexto de crise sanitária, ao qual o capital apropria-se do contexto sanitário para a continuidade e ampliação da exploração e da extração de superlucros, configurando o que Antunes (2002) chama de “capital pandêmico”. Torna-se uma medida político-institucional e econômica que aprofunda o processo de reestruturação produtiva na área da educação, pois movimenta a condução do aparelhamento tecnológico-comunicacional, com a expansão das tecnologias digitais nas instituições públicas e privadas de ensino por meio de plataformas de empresas globais (FERNANDES, GOIN, ROCHA, 2021). O ensino entre telas colabora com a perspectiva individual, privatista, reforça a precarização, o estranhamento ao processo de formação, que pode ficar subsumido ao abismo da despolitização, da negação das formas coletivas de produção do pensamento, conhecimento e ciência. Neste sentido, a crise educacional se aprofunda tendo o ERE como espaço de experimentação e transição do ensino presencial para o ensino entre telas, forçando novas metodologias de ensino, incompatíveis com a proposta político-pedagógica da profissão, contribuindo fortemente para o esvaziamento do papel formativo do docente, em um cenário de esfacelamento do ensino superior, desarticulando-o das diretrizes curriculares. (SILVA, 2019). Gesta-se uma nova cultura formativa, fruto do processo de contrarreforma educacional no país, que dificulta a interação de docentes e discentes na dinâmica universitária antes caracterizada pela troca de experiência e construção coletiva do conhecimento. Cultura formativa alimentada por uma direção altamente tecnificada e mecanizada, realizada mediante processos tecnológicos, impostos em grande medida pela restruturação produtiva que determina uma nova era do trabalho digital, virtual e teletrabalho. (FARAGE, 2021). As mudanças na esfera do trabalho, alinhadas ao contexto pandêmico e educacional intensificaram as demandas de trabalho para aqueles que permaneceram na esfera produtiva, em decorrência das adaptações do ensino presencial para o remoto, e sobretudo, pelas demandas geradas a partir da redução do quadro de docentes nas instituições de ensino privadas. Entende-se que as medidas tomadas em relação à demissão e diminuição do quadro de professores e demais profissionais universitários, correspondem à lógica mercadológica de redução de custos, e maximização de lucros, que se intensificou no cenário pandêmico, tendo como falsa justificativa a grave crise econômica instaurada no país. Observa-se que a medida de implantação do ERE atrela-se aos interesses presentes de tornar o ensino presencial em EAD, potencializando lucros e reduzindo custos. Assim, o Estado não tardou em permitir a utilização de meios e tecnologias da informação para os cursos presenciais, em universidades públicas e privadas, sintonizando os interesses do mercado educacional com as possibilidades que se gestaram a partir da pandemia. A crise educacional e a imposição do ERE tem impactado negativamente à formação, reduzindo-a apenas as aulas, com pouca integração com as atividades de extensão e pesquisa, e tem incidência direta sobre o corpo discente que ficou afastado da dinâmica universitária e construção coletiva do conhecimento. Por fim, compreende-se que as atuais configurações do ensino no Serviço Social tendem a afetar a articulação entre os núcleos de fundamentação das Diretrizes Curriculares, o estágio supervisionado, que vive uma “depreciação de sua importância” (SILVA, 2019), e o Projeto Político-Pedagógico dos cursos que tem sido soterrado mediante as imposições de um ensino tecnificado, desarticulado politicamente, mas direcionado para atender aos interesses do mercado educacional e internacional. É sob este contexto que se apresenta as marcas históricas da Faculdade Paulista de Serviço Social de São Caetano do Sul, que tem 56 anos dedicados à formação. Sua primeira unidade foi inaugurada em 1940, chamada inicialmente de Instituto de Serviço Social de São Paulo (ISS-SP), e tornou-se FAPSS em 1962. Foi a segunda escola de Serviço Social de São Paulo, e a primeira escola masculina de Serviço Social na América Latina. A FAPSS de São Caetano do Sul foi inaugurada em 1966, sendo a primeira instituição de ensino superior no município, e a segunda implantada na região do chamado ABC Paulista, ao longo do tempo atualizou-se em uma perspectiva crítica incorporando as diretrizes da Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa de Serviço Social (ABEPSS). Mas na última década sofre os impactos dos novos desdobramentos do capital sob a educação superior, desde sua venda em 2013 para uma nova mantenedora, a escola passa por densos processos de reorganização curricular, redução do quadro docente e pressões econômicas que tendem a movimentar intensificados processos de precarização do ensino em consonância com o bojo conjuntural do neoliberalismo que incide de modo contundente sobre a história, compreensão e direcionamento do futuro do curso.