Resumen:
O cenário atual do Brasil e especificamente da Amazõnia é nefasto, marcado pela crise sanitária e por um projeto político de morte do Poder Executivo Federal brasileiro, sendo que nenhum dos dois são resultados do acaso, mas sim de processos históricos. Pessoas que moram nas cidades e no campo sofrem com os efeitos dessa realidade. Com desdobramentos severos, uma vez que a pandemia do SARS-CoV-2, também conhecido como novo coronavírus, foi instrumentalizada para potencializar ataques contra os diretos básicos. Os quais apesar de constitucionalmente previstos ainda estão muito longe de serem plenamente assegurados, a exemplo do direito à moradia, as terras e territórios, seja no campo ou nas cidades, somadas a ação/omissão do Estado e os preponderantes interesses do capital. Compreender essa realidade, é um ponto de partida para enfrentá-la. Entendemos que não há possibilidade de combater o sistema capitalista sem dar conta dessa relação sociometabólica com a natureza. A qual foi rompida pelo sistema capitalista, estabelecendo predominantemente, uma relação predatória com a natureza, vista tão somente enquanto repositório de lucros em potencial. Portanto, no capitalismo, o homem se aliena da natureza. David Harvey apresenta a existência de uma nova onda de "expropriação das terras comuns" que conta com o poder do Estado para efetivar o “bárbaro processo de expropriação”. Entendemos com base em David Harvey e Virgínea Fontes que a expropriação não pode ser limitada a um período anterior, denominado de ‘primitivo’, que teria ficado no passado, pois continua ocorrendo e se renovando em nossos dias. Observa-se, portanto, que prossegue um movimento contínuo de “expropriação dos trabalhadores rurais, em especial, nos países onde vastas parcelas camponesas vêm sendo ‘urbanizadas’ ou expropriadas”. A expropriação deve ser compreendida forma ampliada, como processos que roubam dos trabalhadores todas as garantias da sua existência, em que os meios de existência são transformados em capital, entendido como relações sociais e não somente o domínio de coisas, e se vale de três elementos: o Estado, o direito (legalidade) e a violência. Nesse sentido, algumas das principais causas estruturais para a eclosão de epidemias e sua acelerada dispersão em pandemias são identificadas: o modo de uso e ocupação do solo entre campo e cidade, a concentração de terra e recursos naturais com a destruição massiva de ecossistemas e a crescente homogeneização das paisagens decorrente da adesão a monocultura dos plantios. As sucessivas crises do capital, a dependência e a expropriação foram e ainda são estratégias utilizadas para o processo de territorialização do capital no Brasil e em específico na Amazônia. Objetivamos refletir sobre a renovação das estratégias de territorialização do capital na Amazônia. Utilizamos pesquisa bibliográfica e documental na coleta dos dados e analisamos com base na teoria crítica marxista. Identificamos as flexibilizações na legislação fundiária e ambiental, por meio inclusive de instrumentos inadequados no aspecto formal de criação de normas, como Medidas Provisórias, ao invés de um processo amplo e complexo de revisão legislativa a chamada“acumulação por legislação”. A “acumulação por legislação” aprofunda a dinâmica das expropriações, dos cercamentos das terras, expulsam-se populações para dar lugar à produção de commodities ou mesmo para instalação de megaempreendimentos a estes relacionados, seja na área de energia, transporte ou indústrias de beneficiamento de matérias primas. E os conflitos socioambientais como agroestratégias para a continuidade do avanço do Agronegócio, por meio da captura e estoque de terras e posterior inserção no mercado. Podemos afirmar que as políticas de destinação de terras são apontadas nesses estudos como instrumentos de legalização da grilagem, estímulo aos conflitos fundiários, concentração de terras, ao latifúndio, a monocultura, a escravidão, perpassadas pela colonialidade do poder e estão diretamente relacionadas ao modelo de “desenvolvimento” que tem como fundamento a desigualdade, configurando verdadeiras agroestratégias. As agroestratégias indicam uma renovação da implantação do capitalismo nessa região com alto grau de impacto na reprodução social, no modo de vida e organização territorial, respectivamente, dos trabalhadores e das comunidades tradicionais. Sem dúvida a disputa pela terra/território assume uma centralidade nas situações de conflitos, uma vez que a “terra tradicionalmente ocupada” pelas comunidades tradicionais se colocam como obstáculo à implantação/ampliação das atividades ligadas ao agronegócio e ao extrativismo mineral. Por meio do levantamento de dados e observações atentas a realidade socioambiental da Amazônia, a concentração fundiária, expressa a desigualdade na distribuição de terras, situação favorecida pela atuação do Estado, por meio da “acumulação por legislação” e agroestratégias, que ao longo dos anos tem negligenciado a proposta da reforma agrária ou promovido legislações favoráveis a lógica de mercado, gerando inúmeras tensões e conflitos territoriais. Sendo precípuo para o capitalismo o rompimento da relação sociometabólica entre homem e natureza, não é possível resolver esse cenário se o sistema capitalista permanece vigente. No entanto, precisamos construir alternativas para a nossa situação atual, partimos do pressuposto de que é indissociável o tratamento conjunto da política urbana e agrária, bem como das questões ambientais e fundiárias. Para tanto, é necessário compreender que somente as políticas de destinação de terras, a exemplo da atual política de regularização fundiária, não resolve e tão pouco diminui o problema socioambiental da Região Amazônica e inclusive a regularização fundiária é indicada como instrumento para o aumento da desigualdade social e da concentração de terras, quando não tratada a partir da compreensão de Ordenamento Territorial, ou seja, o processo de gestão territorial contínua, transparente e democrática. A política de ordenamento territorial, que visa a promover o desenvolvimento sustentável, deve ser pactuada com os diferentes atores: federal, estadual, municipal e sociedade civil, instrumento que permite conhecer a realidade fundiária e planejar a destinação das terras.