Resumen:
O presente artigo coloca na pauta do trabalho profissional de assistentes sociais a questão do assédio moral, identificado nas relações e processos de trabalhos nos quais assistentes sociais se inserem, a partir de uma experiência acadêmica de estágio supervisionado e de demandas dos profissionais que chegam ao CRESS (Conselho Regional de Serviço Social) da 6ª Região, Seccional de Juiz de Fora (Minas Gerais), no Setor de Orientação e Fiscalização (SOFI). Direcionada pela Política Nacional de Fiscalização do Conjunto CFESS/CRESS (Resolução CFESS – Conselho Federal de Serviço Social - 512/2007), a fiscalização do exercício profissional possui caráter preventivo e educativo no que tange à orientação do Código de Ética (1993) e da Lei de Regulamentação da Profissão, número 8.662, de 7 de junho de 1993, bem como, as demais Resoluções emitidas pelo CFESS.De acordo com o levantamento de dados disponibilizados pelo CRESS/6ª Região (Vieira, 2017) e do Relatório produzido pelo SOFI (2012), identifica-se que 18,7% das demandas ao CRESS, referem-se às relações de trabalho de assistentes sociais em seus mais diversos espaços sócio-ocupacionais. Profissionais que foram atendidos no CRESS demonstraram dificuldade no exercício pleno da ética profissional, o que gerou, desgaste físico e mental, redundando em “insegurança ética”. Entretanto, o assédio moral se manifesta, no plano da imediaticidade do efetivo exercício profissional, através de conduções abusivas, intencionais e recorrentes de chefias, colegas de trabalho e, até mesmo, de usuários dos serviços prestados por assistentes sociais, sejam por orientações verbais ou escritas, que desqualificam, constrangem e isolam profissionais que passam a sofrer com o trabalho. Entretanto, estas manifestações de assédio moral possuem raízes mais profundas e são analisadas aqui, para fins do desenvolvimento do artigo, como uma das estratégias contemporâneas de
controle da força de trabalho, tendo em vista a superexploração e a subsunção formal da força de trabalho (Marx, 1969). Em tempos de crise do capital, com bases na financeirização do capital, na superação, em processo, do modelo de acumulação taylorista/fordista para a acumulação flexível, inúmeras são as estratégias de gestão e racionalização da força de trabalho, tendo em vista a ampliação, em escala exponencial, da capacidade de acumulação do capital.A partir da análise dos dados apresentados no Relatório produzido pelo SOFI (2012), o assédio moral sofrido por assistentes sociais atravessa interesses institucionais que contribuem para a reprodução do capital, como a polivalência, a subcontratação (terceirização), formas alternativas à legislação trabalhista que são legalmente burladas, contratando assistentes sociais de formas precárias, para desenvolver o trabalho, em condições igualmente precárias. Sendo o assistente social um trabalhador assalariado está submetido à logica e às manifestações deste novo modelo de acumulação. Além do processo de alienação, do desenvolvimento de atividades com finalidades a um fim, de produzir concretamente recursos institucionais com vistas à execução de políticas sociais públicas ou privadas nas quais está inserido, este trabalhador, coletivo, possui outras particularidades em face dos demais: as contradições que envolvem o estatuto profissional, Projeto Ético-Político dos assistentes sociais brasileiros e as demandas institucionais; a tensão entre classes sociais e; a manifestação e luta por hegemonia de projetos sociais antagônicos e divergentes (Iamamoto, 2007 e 1988). O Relatório do SOFI aponta, ainda, para um dado peculiar em relação ao trabalho de assistentes sociais na contemporaneidade, a explicitação da luta por hegemonia na direção teórica, política e ideológica que fundamentam historicamente o trabalho profissional. O Serviço Social brasileiro que sofreu uma grande inflexão no início dos anos de 1980, na esteira da Reconceituação do Serviço Social latino-americano, superando o Serviço Social tradicional e lançando bases sólidas para o enfrentamento do conservadorismo profissional - fundamentado no positivismo e na sua tradição, tais como, as influências do funcionalismo, do estruturalismo e do estrutural-funcionalismo. Não obstante, como bem observou Netto (1996), em prospecção quanto às vertentes teórico-profissionais, àquela época, na primeira metade dos anos de 1990, identifica-se “o desenvolvimento de uma
vertente neoconservadora, inspirada fortemente na epistemologia pós-moderna, afinada com as tendências da moda das chamadas ciências sociais e tendo o seu gume crítico apontado para a revisão dos substratos das conquistas anticonservadoras dos anos oitenta” (Netto, 1996, p. 127,
grifos do autor), capaz de ressuscitar práticas tradicionais (estratégias profissionais), funcionais à ordem do capital. Concomitantemente, identifica-se, a partir do Relatório do SOFI, o que Netto (1996, p. 127) denominou de “repulsa anarcoide ao universalismo da modernidade (...), seja no irracionalismo aberto (...), seja no relativismo mais primário (com a equalização de todas as formas de socialidade)” que, em síntese, equipara-se à onda pós-moderna que atinge, com vigor, a direção social crítica alicerçada na teoria social de Marx, substrato da vertente “intenção de ruptura” (Netto, 1994, p. 247 e ss). Profissionais assediados em seus espaços sócio-ocupacionais, são em geral, aqueles que defendem o Projeto Ético-Político e fazem o enfrentamento teórico e político em oposição ao neoconservadorismo e às expressões pós-modernas que têm invadido o Serviço Social.Referências bibliográficasBrasil.
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Relatório de Fiscalização – COFI Juiz de Fora, 2012.IAMAMOTO, Marilda Villela.
Serviço Social em tempo de capital fetiche: capital financeiro, trabalho e questão social. São Paulo: Cortez Editora, 2007.IAMAMOTO, Marilda Villela e CARVALHO, Raul de.
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Revista Serviço Social e Sociedade. São Paulo: Cortez Editora. Ano XVII, nº 50, abril de 1996.VIEIRA, Pedro l. C. - As Relações e Condições de Trabalho do Assistente Social na Contemporaneidade – Juiz de Fora – Graduação em Serviço Social /
Universidade Federal de Juiz Fora - Trabalho de Conclusão de Curso, 2017.