A educação se constitui em uma ferramenta fundamental ao desenvolvimento dos povos, sendo capaz de atenuar desigualdades socioeconômicas, possibilitar a mobilidade social, transformar vidas, comunidades, nações, regiões. Na América Latina, entretanto, em face às experiências neoliberais, que se iniciam no Chile, ainda na década de 1970 e se expandem pelo continente, a educação superior distancia-se da sua função questionadora e articula-se, cada vez mais, à lógica do capital, com impactos expressivos na permanência universitária e, portanto, com implicações e retrocessos, tanto no que se refere aos contextos social e econômico, quanto no tocante aos âmbitos acadêmicos e profissionais. Com isso, observa-se que o sistema educacional, nos últimos anos, tem sofrido um processo de recrudescimento, sendo marcado por um conjunto de contrareformas que impactam na redução do financiamento, processo de mercantilização e privatização da educação. Os quais afetam consideravelmente o funcionamento da universidade, e o processo de acessibilidade e garantia do ensino público, gratuito, presencial e de qualidade. Compreendendo a importância do debate da permanência universitária para além dos seus rebatimentos no plano acadêmico, englobando, portanto, o conjunto da sociedade, esse painel se propõe a discutir essa temática, no contexto do ultraneoliberalismo contemporâneo, à luz de experiências brasileiras. No Brasil, em que pese a política de assistência estudantil ter sido iniciada ainda na primeira metade dos anos 1930, como parte do projeto político educacional do governo Getúlio Vargas, que previu, na Constituição de 1934, a doação de fundos a estudantes necessitados, por meio do fornecimento de material escolar, bolsa de estudo, assistência alimentar, médica e odontológica, a criação de normativas oficiais para a ampliação do acesso e da permanência estudantil no ensino superior é um fenômeno relativamente recente. E se inicia, de forma mais intensa, neste novo século, com ações de inclusão e permanência insuficientes, sobretudo no que se refere aos grupos sociais tradicionalmente excluídos desse nível de ensino no país, como os indígenas, remanescentes quilombolas e outros. A questão da permanência engloba uma ampla rede de causalidades, que vão além das normativas, diretrizes e políticas governamentais, embora essas sejam imprescindíveis à compreensão dos processos de expansão e retrocessos vivenciados pela educação superior no Brasil, que traz por marca à manutenção de uma estrutura social desigual e excludente. O contexto histórico das políticas nacionais de assistência estudantil e de permanência no ensino superior será, assim, o Tema 1 do painel ora apresentado. Neste buscar-se-á analisar as mudanças sofridas no meio universitário brasileiro que, até meados dos anos 1970, período posterior à reforma universitária de 1969, era composto, na sua quase integralidade, por jovens pertencentes à elite do país. A partir dos anos 1990, sob a influência do Banco Mundial, o Brasil efetua mais reformas no Ensino Superior, sendo incentivada a privatização desta modalidade de ensino, fenômeno que já ocorria em demais países da América Latina. Como consequência, há uma expansão significativa no número de estudantes no país, sobretudo nas instituições privadas que passam a contar com o incentivo de diretrizes federais, como a instituição do Programa Universidade para Todos (PROUNI) e do Fundo de Financiamento Estudantil (FIES). Estas ações promoveram o custeio do curso de graduação para estudantes de camadas populares, mediante o financiamento estatal das mensalidades dos universitários contemplados, realizado nas modalidades parcial ou total. Ao tratar da expansão recente do ensino superior público, busca-se abordar também o Plano Nacional de Educação (PNE) para a rede federal e o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI), instituído em 2007, sob a égide de um governo liderado pelo Partido dos Trabalhadores. Tendo como principal objetivo a ampliação do ingresso e a redução das taxas de evasão nos cursos presenciais de graduação nas universidades públicas, estes instrumentos, ao tempo em que viabilizaram a expansão de vagas nas Instituições de Ensino Superior (IES), instituem as políticas de ações afirmativas na educação superior. Ao longo do tempo, a Política de Assistência Estudantil no Brasil tem atravessado avanços e retrocessos e apesar de ser uma atribuição do Estado prevista na Constituição Federal de 1988, defronta-se com muitas dificuldades para assegurar a manutenção de estudantes socioeconomicamente desfavorecidos na universidade. Após esse panorama analítico geral das políticas afirmativas e de permanência, o Tema 2 aborda o cenário de crise capitalista atravessada pelo Brasil no contexto neoliberal, com graves implicações para a socioeconomia nacional, como a redução dos gastos estatais com políticas públicas, aumento do desemprego, precarização do trabalho, diminuição do poder de mobilização da classe trabalhadora, etc. trazendo novos elementos à análise da permanência estudantil universitária, a partir de um estudo de caso do curso de Serviço Social de uma universidade brasileira implantada como resultado das ações do REUNI, a Universidade Federal do Recôncavo da Bahia. Dentre os novos aspectos abordados serão também tratados os impactos da crise sanitária decorrente do novo coronavírus (SARS-CoV-2) na permanência estudantil de um grupo composto, eminentemente, por mulheres negras, oriundas dos estratos sociais menos favorecidos. Com isso, busca-se refletir como a estratégia do Ensino Remoto Emergencial (ERE), para manter o ensino superior durante a pandemia, contraditoriamente, se mostrou excludente, tendo em vista a variação social e econômica dos estudantes, a partir do novo perfil de discentes oriundos da democratização do acesso ao ensino superior. No ERE alguns mecanismos são necessários como, por exemplo, conexão à internet, equipamentos de qualidade e um espaço adequado para o estudo. Esse fenômeno impactou diretamente na permanência dos discentes durante a pandemia, uma vez que a ausência da internet ou do equipamento adequado poderia ocasionar a evasão do estudante. Com o prolongamento das atividades remotas algumas medidas foram desenvolvidas, como a oferta de bolsas oriundas da política de assistência estudantil, direcionadas para a acessibilidade digital, no entanto outros fatores que permeiam a formação acadêmica, para além das condições materiais, como as condições simbólicas que atravessam a graduação remota em tempos de pandemia, serão aprofundadas na discussão do Tema 3.